24 de jan. de 2010

Sobre Fukuyama...

Artigo esclarecedor de Paulo Roberto de Almeida, no Boletim Mundorama:

É só seguir o link.

Abraços,

23 de jan. de 2010

São Paulo admite ter de usar professor reprovado em exame

FÁBIO TAKAHASHI
da Folha de S.Paulo

A Secretaria da Educação de SP anunciou ontem (22) que poderá atribuir aulas a professores reprovados em seu processo de seleção para docentes temporários para a educação básica.

Dos temporários que já trabalharam na sala de aula (pouco menos da metade do total de docentes), 40% foram reprovados --não conseguiram acertar metade das 80 questões.

Segundo o secretário da Educação, Paulo Renato Souza, haverá dificuldades para preencher vagas em algumas escolas, principalmente para as matérias de física e matemática.

Ao justificar a possibilidade de convocar professores reprovados, o secretário afirmou que "a nossa prioridade é garantir aulas aos alunos".

Os sindicatos do setor dizem que é quase certo que os abaixo da nota de corte sejam convocados, principalmente para atuar na periferia das cidades da Grande SP, onde o desempenho dos alunos já é mais baixo.

Ainda não é possível saber quantos dos reprovados terão de lecionar, pois o processo de distribuição de aulas não começou --primeiro escolhem os concursados; os temporários preenchem as aulas que faltam.

Apesar do ano passado ter terminado com 80 mil temporários e cerca de 130 mil concursados, a rede chegou a precisar de mais de 100 mil não concursados (para suprir casos como licença e aposentadoria).

Além dos temporários, o exame também foi feito por outros candidatos --total de 182 mil, dos quais 48% não atingiram a nota de corte. O total de aprovados foi de 94 mil.

Novo discurso

A prova para seleção de temporários foi adotada no ano passado pelo governo José Serra (PSDB). Antes, o critério para a contratação eram os diplomas do candidato e o tempo de serviço.

Ao lançar o projeto, o governo afirmou que quem não atingisse a nota mínima não poderia lecionar. A possibilidade de reprovados darem aulas neste ano letivo foi anunciada ontem.

Paulo Renato afirmou que o corpo docente deste ano está melhor. A explicação do secretário é que foi "uma inovação" classificar docentes com base em seus conhecimentos.

Disse ainda que, caso tenha de contratar os reprovados, serão selecionados os de melhor desempenho. Além disso, a pasta irá criar cursos a distância para capacitação específica em física e matemática.

Um atenuante para o desempenho dos docentes, afirma Paulo Renato, foi a dificuldade das provas, consideradas por ele como "complexas e longas".

O presidente do CPP (um dos sindicatos dos docentes), José Maria Cancelliero, teve avaliação semelhante. O exame foi feito pela Vunesp, que aplica o vestibular da Unesp.

Além de permitir que reprovados lecionem, o governo alterou outro critério. Inicialmente, só iria valer a nota da prova. Após negociar com sindicatos, a pasta decidiu levar em conta o tempo de magistério (que dá bônus de até 20% na nota).

13 de jan. de 2010

E aí?

Olá leitores deste blog. Mais uma vez, uma dica de filme. Interessante que não me senti - a princípio - atraído pela temática de "Across the universe" (2007), mas ontem assisti e gostei das cores e, obviamente, do inúmeros clássicos dos Beatles presentes ali. Aliás, só Beatles.

Pra salientar o que considerei relevante no filme para além das discussões e links descarados que o diretor se propôs a fazer, entendo que o debate que me tocou é: esquerda x direita, revolucionários/reacionários, consicentes/alienados... ainda é uma discussão válida? Ainda são utilizáveis estes "rótulos"?

Penso que de certa maneira, vivenciamos um esgotamento desses modelos explicativos no que tange a esfera política, cultural e social dos indivíduos, pensando individual ou coletivamente. Decorre daí que o filme, como a maioria hollywoodiana, escapa pela tangente a la Dickens: o amor resolve tudo, ou pelo menos, apara as arestas para que "tudo fique bem no final".

Ainda que haja impossibilidade em se falar de direita ou esquerda puras, é possível ser idealista a tal ponto? Não vi isso na Dinamarca no fim do ano passado... e você, concorda? Vejam o clipe do filme abaixo e acompanhem com a letra:



10 de jan. de 2010

Entrevista - Fábio Konder Comparato - parte 1

Parte 1 da entrevista com o jurista Fábio Konder Comparato (Especial 2010 - edição 578)

CartaCapital: O fato de escândalos virem à tona hoje seria sinal de uma melhora no País? O sistema jurídico funciona a contento?
Fábio Konder Comparato:
Eu descobri, num conto de Machado de Assis, a explicação que sempre procurava sobre o caráter nacional brasileiro. O conto é “O Espelho” e trata-se de alguém que numa roda de amigos afirma com espanto geral que cada um de nós tem duas almas. Tem uma alma externa que é aquela sempre mostrada ao público e, muitas vezes, é utilizada para nos julgarmos. E tem uma alma interna que é sempre escondida e serve para nós julgarmos o mundo de dentro para fora.

O nosso sistema jurídico político de fato tem duas almas, ele é dúplice em ambos os sentidos da palavra: é dobrado e dissimulado. Existe a alma externa que pode ser resumida no princípio de que todos são iguais perante a lei, mas existe a alma interna que não sustenta, mas está plenamente convencida de que há sempre alguns que são mais iguais do que os outros.

CC: O senhor poderia dar um exemplo?
FKC:
Os exemplos abundam. Nesse particular, gostaria de lembrar mais um exemplo literário. Nas “Memórias de um Sargento de Milícias”, de Manuel Antônio de Almeida, três senhoras vêm à casa do Major Vidigal, que era o chefe de polícia, para pedir a condescendência dele em relação a um jovem soldado. O major fecha a carranca e diz que não pode fazer nada porque existe uma lei. Uma das senhoras diz: “ora a lei, a lei é o que senhor major quiser”. Então, completa o Manuel Antonio de Almeida: “o major sorriu-se com cândida inocência”. É um pouco isto.

A lei existe, em princípio, igual para todos. Mas sabemos. Como no último caso do “Arrudagate” em Brasília, a lei penal dificilmente se aplica ou não se aplica a todos aqueles que estão no poder. É exatamente isso que explica o fato de termos uma Constituição modelar, mas a nossa vida política estar muito longe do modelo constitucional. A Constituição se abre com a declaração de que a República Federativa do Brasil é um estado democrático de Direito e, na verdade, nós não temos nem República, nem Democracia, nem Estado de Direito.

CC: Por que não?
FKC:
No Brasil não existe a consciência de bens públicos. Quando um bem não é propriedade particular de alguém, ele não pertence a ninguém. Então, a grilagem de terras públicas e a utilização de canais de comunicação, com o espaço público usado para a defesa exclusiva de interesses privados, é a regra geral. Um outro exemplo que todos conhecem no exercício dos cargos públicos: existe uma regra de ouro (uma referência moral): ‘Mateus, primeiros aos teus’. Quanto à democracia, a nossa alma interior, para voltar à comparação inicial, é e sempre foi a oligarquia. Povo não existe porque, a rigor, ele só passa a ter consciência dele mesmo nas grandes disputas futebolísticas. Fora disso, o povo não tem consciência de que ele existe, de que é digno e merece ser tratado com respeito.

Numa democracia, a norma ou conjunto de normas supremas que é a Constituição, obviamente, tem que ser aprovada pelo soberano. A soberania do povo é o supremo poder de controle. Mas nenhuma Constituição brasileira, até hoje, foi aprovada pelo povo. A atual Constituição já foi remendada 68 vezes, o que dá a apreciável média de mais de três remendos por ano. Em nenhuma dessas ocasiões chegou-se sequer a pensar em consultar o povo. Já não digo pedir a aprovação. E o Estado de Direito? Vou dar um exemplo gritante: os controles jurídicos sobre os poderes do Estado, Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público são muito débeis, em alguns casos totalmente inexistentes.

Um exemplo atual com relação ao Ministério Público Federal: em outubro de 2008, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados de Brasil (OAB), por uma proposta minha, decidiu ingressar com uma argüição de descumprimento de preceito fundamental no STF objetivando a definição, pelo tribunal, sobre a abrangência da lei de anistia de 1979. Ela beneficia ou não os homicidas, torturadores, estupradores do regime militar? Pela lei que rege essa demanda, o Ministério Público, quando não é o arguente, tem cinco dias para se manifestar. A Procuradoria Geral da República foi intimada no dia 2 de fevereiro de 2009 a se manifestar e, até hoje, mais de dez meses depois, não devolveu os autos. Em agosto desse ano eu fiz uma petição ao relator, pedindo a ele que mandasse requisitar os autos. Essa petição não foi sequer despachada porque os autos não estavam no STF.

Ora, existe uma lei que regula os casos de improbidade administrativa. Um deles é deixar de praticar ato de ofício ou praticá-lo contra a disposição expressa de lei. Acontece que esta ação de improbidade administrativa é proposta unicamente pelo Ministério Público. Então, o que pode fazer a OAB? Representar à Procuradoria Geral da República dizendo que o seu chefe cometeu uma improbidade administrativa?

CC: Nesse caso, fala-se de 144 mortes sob tortura e 125 desaparecidos...
FKC:
Exatamente. Mas essa insensibilidade é histórica. Durante quase quatro séculos nós tivemos uma escravidão. Foram escravizados cerca de cinco milhões de africanos e afro descendentes. O regime da escravidão era de uma crueldade exemplar. De tal maneira cruel, sobretudo no campo, que o escravo para sair da escravidão só tinha dois caminhos: o suicídio ou a fuga. Hoje nenhuma escola fundamental do Brasil, pública ou privada ensina aos jovens brasileiros o que foi o crime coletivo da escravidão. Para sair da escravidão só tinha dois caminhos: o suicídio ou a fuga.

Hoje nenhuma escola fundamental do Brasil, pública ou privada, ensina aos jovens brasileiros o que foi o crime coletivo da escravidão. Nós, no dia 13 de maio de 1888, viramos a página. E é isso o que queremos fazer hoje com os horrores do regime militar. Está nos nossos costumes. O pior é que nos consideramos um povo bom, compassivo, generoso. Toda vez que falo o contrário, sou duramente criticado. Ou então acham que, como dizia a minha santa mãe, já nasci com mau humor.